Dialética Ideológica, desconstrução passada, nova fórmula

Análise do texto de Renato Ortiz, sobre o CPC da UNE.

Um texto muito interessante, que nos permite a compreensão desse importante movimento, mostrando sua ideologia, o que almejavam, seus objetivos, e dados que informam sobre qual forma eles utilizariam para realizar essas ações.

 

Não apenas destacando o lado positivo, e a boa intenção do movimento, mas também fazendo críticas ao CPC. Críticas como a de o Centro Popular de Cultura não considerar como sendo arte as manifestações sem cunho crítico de transformação social. Essa radicalização do CPC acaba causando uma alienação, que era justamente o que eles questionavam. Na parte crítica, nos mostra fatores a observar, inclusive, que um outro erro do CPC foi o de não compreender seu tempo histórico.

As palavras chave desse texto são Alienação X Consciência. Essa dialética é abordada durante o texto. Dialética e Alienação que podem ser trabalhados e observados segundo conceitos de Marx. Lembrando que, para Marx ideologia é falsa consciência elaborada por pensadores burgueses, ou seja, ela é negativa.

A partir do estudo do Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes, podemos interpretar e repensar sobre vários fatores e aspectos, como o folclore, a diferença de cultura tradicional e popular. A dissociação de cultura popular e folclore. E com esse estudo conhecemos importantes mentes e suas correntes de raciocínio, como Gramsci, Ferreira Goulart, Carlos Estevão, Lukács, entre outros.

É importante, para entender a formação do CPC da UNE, conhecer e compreender seu momento histórico, de efervescência política, da radicalização do movimento político do golpe militar.

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CPC da UNE, 62-64, Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes, aglutinou grupo de pessoas que pensam cultura como consciência, modificação e transformação social. Desconstruindo, com isso, o conceito anterior de cultura. Dualidade: Consciência x Alienação.

Busca conceito de alienação em Marx para fundamentar a teoria. Investiga agentes culturais, pessoas que atuavam no CPC da UNE. Ferreira Goulart e Carlos Estevão.

Debatem o folclore, tradição para manutenção de valores burgueses na Europa. Cultura popular brasileira é uma forma tradicional de pensar, ou não? Pode transformar ou não? Ou é apenas um instrumento de manutenção dos interesses burgueses no Brasil.

Essa idéia tem dupla face. Tem problema de acesso, como critério de classe. Cultura tradicional x popular (instrumento de transformação e consciência da sociedade).

CPC aglutina jovens pensadores que vão idealizar essa nova maneira de fazer cultura, como consciência, em detrimento da arte pela arte (só fazer arte para se expressar). Cultura como movimento de transformação social.

 

CPC ocorreu entre 62 e 64.

Influenciados pelos intelectuais do ISEB (instituto que reúne intelectuais que também pensam de forma diferente. Pensam o Brasil para entendê-lo. Antes você tinha pensadores: Sergio Buarque de Holanda, Paulo Freire; agora estamos falando de grupos. ISEB era mais radical à esquerda. Radicalizam o pensamento. Colocam na ponta as injustiças, perspectivas de se formar uma nova sociedade).

 

CPC trata cultura pelo aspecto das artes, como modificação social.

Inicia no momento histórico em que o Brasil vivencia o pré-golpe. Efervescência política, nacionalismo. Direita – Agentes do golpe militar. Brasil, ame-o ou deixe-o, defender contra o comunismo. Esquerda – Combate a burguesia nacional, a verdadeira soberania nacional é a do povo, luta do povo.

 

Momentos ímpares da formação da cultura brasileira, de estudar, compreender como as pessoas pensavam o Brasil. Avaliar, introjetar pensamento, opinião sobre o assunto.

Jovens artistas intelectuais que, com base na UNE aglutinaram, tinham como concepção transformar o mundo, Brasil, localidades, através das artes. Síntese do movimento cultural dos anos 60. Foi interrompida pelo golpe militar de 1º de abril de 64. Legado leva para o futuro pessoas que produziram arte e cultura ao longo da vida. Ferreira Goulart, Arnaldo Jabor… Figuras que se tornaram referência nas artes do Brasil. Introjetou nova tese sobre cultura, cultura engajada. Palavras-chave fundamentais do texto: Alienação e Consciência. Consciência em Marx, Gramsci.

Alucinação, consciência em Marx: Alucinação em Marx (bem desenvolvida em O Capital) fala da compreensão da alienação no sistema produtivo. Compreender porque trabalhadores aceitam a condição de resignação, recebendo o salário que é a décima parte de sua produção. Antes da implantação do sistema capitalista, o trabalhador que produzia bens manufaturados detinha as próprias ferramentas, instrumentos de trabalho. Faziam do começo ao fim. Com o advento da tecnologia, das máquinas, esses trabalhadores perderam espaço para o sistema produtivo. Maior produção, maior qualidade, menor preço. O trabalhador perde seus instrumentos, as ferramentas manuais que se tornaram obsoletas. Resta apenas a mão de obra. Começa a alienação do trabalhador, que é incorporada ao sistema produtivo. Trabalhador incorporado à fábrica, fará apenas um tipo mecânico de tarefa, pois a produção é fragmentada. Tiram do trabalhador todas as suas qualidades, todo seu proveito. Ao não entender o sistema produtivo, trabalhador se contenta em receber apenas a décima parte de seu trabalho. A mais valia enriquece os proprietários das fábricas. Ocorre expropriação do excedente de produção. Você trabalha oito horas e recebe por dez minutos. Exploram muito a mão de obra do trabalhador. Ao entrar na fábrica, sem conseguir compreender o todo, torna-se um trabalhador alienado, pois é ameaçada constantemente, podendo facilmente ser substituído por outro.

A consciência é a desalienação. Acabar com a alienação, abrindo a cabeça do sujeito para novas idéias, transformar o sujeito.

Gramsci diz que sem mudança na infra-estrutura, no sistema produtivo, você não vai conseguir mudar a sociedade. Lukács aprofunda a tese e diz porque o sujeito continua alienado.

Gramsci diz que precisa que os ser humano transforme sua maneira de agir através de movimentos culturais. Todos nós somos intelectuais, porque pensamos. Mas apenas alguns exercem a função de intelectuais. Todos formamos idéias, mas apenas alguns exercem a função social de explicar as coisas, e convencer as pessoas (Intelectuais Orgânicos).

Adam Smith diz que os homens são naturalmente desiguais. A origem da desigualdade dos homens está em sua própria natureza, a sociedade sempre será desigual. Dizia glória às nações onde a sociedade é formada por pessoas perseverantes, ousadas, competentes, pessoas que formam a sociedade que gera riqueza. Nas sociedades pobres, as pessoas são desprovidas de inteligência, de liderança, disciplina, vontade de trabalho, ele critica individualmente as pessoas dos países sub-desenvolvidos. É uma tese preconceituosa, racista. Aceitamos condições porque sempre nos disseram que era dessa maneira (escola, mídia, igreja, família), os Aparelhos Ideológicos de Estado, para introduzir uma hegemonia.

Gramsci diz que para mudar o mundo, sociedade, transformando o modo das pessoas pensarem, é preciso criar novos conceitos hegemônicos, a luta de idéias, em última estância, a luta de classes (detentores dos meios de produção x detentores da mão de obra). Todos que formaram o CPC iam buscar no teatro, na música, cinema, uma caixa de ressonância para divulgar novas idéias apresentadas, mostrar ao povo, apresentar na forma de teatro, música, expressões onde as pessoas se dessem conta de que estavam sendo exploradas, que essa hegemonia deveria mudar. Mostrar nova leitura, novo instrumento de abrir a Consciência.

Existe uma dualidade importante de “Consciência e Alienação” que se transforma também e tem outras idéias, contextos. Alienação na atualidade> fetiche de consumo (capacidade de dizer “eu tenho” a marca cara). Fetiche de consumo é a fantasia que a pessoa tem de poder adquirir um produto dentro de um espaço físico sagrado de consumo, como uma loja famosa como a Daslu, Oscar Freire. Pessoa sente-se bem só de estar lá, gera uma alienação.

Quando se compreende que o valor real do produto não é de fato o valor pelo qual o produto está sendo vendido dentro desse “espaço sagrado”, que é determinada loja, você adquire consciência.

Para o pessoal do CPC da UNE, o roque é o produto mais visível da alienação, porque nos anos 60 o roque provoca a idéia de desalinho. Muitos se encantam, se embalam ao som do roque americano, sem nem saber a letra, o que estão cantando. Isso é alienação.

CPC da UNE possui dois elementos fundamentais. Só foi possível ele existir pela conjuntura política da época, que era radicalizada. A idéia de que toda forma de arte existente, dominante deveria servir para contestar. Sentido de nacionalidade, nacionalismo. Golpe militar foi dado pela bandeira do nacionalismo, direita. Defesa da soberania nacional, CPC, bandeira da esquerda.

CPC fornece novas idéias sobre o que é cultura popular. Folclore é a manifestação artística cultural das tradições, tradicionais, necessidade da classe burguesa de preservar origem, idéia de folclore em relação á Europa, não ao Brasil.

Ferreira Goulart dissocia a idéia de folclore e cultura popular, para dizer que nesse momento, dissociada do folclore, cultura popular passa a ter outra definição, como instrumento de consciência, transformação. Cultura popular é do povo para o povo. Folclore realmente são manifestações populares das tradições, símbolos, danças, personagens que resgatam momentos passados, símbolos, culturas seculares.

Cultura popular se dissocia de folclore pois, por ela ser processo de transformação, sendo um novo conceito, não pode estar vinculado à tradição. Nesse momento, concepção de cultura popular passa a ser distinta de folclore, sem conotação de tradição, mas é uma cultura contextualizada, vinculada ao povo, proletário, tem como fundamento processo de transformação, a consciência, luta social, necessidade da sociedade se organizar em grupos (Concepção do CPC).

Cultura popular é forma de compreender a realidade do povo. A palavra transformação precede um importante elemento de compreender a realidade.

Para o pessoal do CPC, religião, carnaval e futebol, eram considerados como algo que transforma o fictício, a ficção, em realidade para assim alienar o sujeito da condição social em que vive.

Criticam os epifenômenos, onde as sensações do corpo dominam as sensação da mente, como o êxtase do carnaval.

Renato Ortiz faz uma crítica a um grande erro cometido pelo CPC. Para CPC não há condições de definir cultura popular, engajada, se não for para o processo de transformação de consciência. Roque para eles é abstração demasiada, instrumento da Indústria Cultural. Não dá para distinguir a cultura, desqualificando a outra por não existir como instrumento de consciência, ser simplesmente a arte pela arte, como a cultura amorosa.

Ao radicalizar a cultura como instrumento de transformação, cria-se também uma alienação, uma falsa consciência, que eles mesmos criticavam. Causa alienação, por mensagem, conceito não se transforma em uma real consciência. Problema de estreiteza e radicalização.

Falsa consciência. Concepção de ideologia em Marx é negativa. Marx diz que a ideologia é a falsa consciência, pois ela foi elaborada por pensadores burgueses. Para Marx, o pensamento de Adam Smith é falsa consciência, pois o pensamento de Smith justifica as diferenças sociais.

Você elimina a falsa consciência quando permite que o trabalhador perceba que está sendo explorado, que ganha muito menos do que deveria. Quando Marx diz que a diferença de classe não é natural (tese defendida por Smith), e sim social, ele desconstrói a idéia anterior, dizendo que Smith fez uma falsa consciência, criando uma falsa hegemonia.

Para Marx a diferença não é natural, ele diz que ela é feita pelas relações sociais econômicas. Gramsci diz que as pessoas admitem essa desigualdade, devido a fatores culturais, elas foram ensinadas assim.

“A desigualdade começa a partir do momento em que um homem cerca um pedaço de terra, diz que é dele, e os demais são suficientemente idiotas de acreditar.” Discurso sobre a origem da desigualdade dos homens, Jean Jacques Rosseau.

Chegamos ao ponto do mundo da fantasia, do capital virtual, que são apenas símbolos, como a bolsa de valores, valores sem lastro material.

A política é transformadora. Os movimentos de transformação do CPC da UNE são políticos. Levar peça de teatro para mostrar que trabalhadores são manipulados é fazer política. Exemplo: Peças de Vianinha.

Nelson Rodrigues, como conservador, dialoga com Vianinha, que era oposto, de esquerda. Nelson Rodrigues era autor conservador, oposto ao CPC. Peças revolucionárias que contestam valores da família burguesa, como “Engraçadinha”, “Bonitinha, mas Ordinária”. Escandaliza de modo que as pessoas, ao verem as peças se viam na cena.

CPC enfrentou uma correlação de forças, que é auto-explicável, quando aplicada. CPC tem força limitada e donos do meio de produção, capital, tem muito mais força que eles.

Problema da alienação, consciência passa a ser de correlação de forças, quem tem mais força, capacidade para dominar. Capacidade ou não de o CPC vingar, fazer o que pretendiam fazer, mudar o capitalismo através de peças, teatros, etc. Não foi suficiente porque eles não possuem o que os donos de produção tinham, os Instrumentos Ideológicos de Estado.

CPC pressionou João Goulart a tomar decisões que perturbaram o outro lado também. O problema do CPC foi o de não entender seu tempo histórico, achando que tomariam o poder. Porém, no final quem ganhou foram seus opositores, com o golpe militar.

Como mencionado, em primeiro de abril de 64, com o golpe militar, o CPC é desfeito.

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